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A neurose da produtividade

Grupo Reinserir

Estamos vivenciando um momento extremamente novo, difícil e doloroso. Muitos de nós sendo marcados pela ‘neurose da produtividade’. A quarentena e o isolamento social advindos do novo coronavírus tem proporcionado aquelas pessoas que podem estar em casa um tempo ocioso que veja, não pode ser desperdiçado, não é mesmo? Irônia. Relatos de pessoas que dizem ‘estou me sentindo zero produtivo(a)’. Devemos ser produtivos a qualquer custo. Devemos? Nunca se leu tantas dicas infalíveis nas redes sociais como nos últimos tempos: faça yoga! Medite! Faça cursos online! Assista lives! Crise de ansiedade só em digitar todas estas imposições. Imposições. Porque a gente tem a mania de achar que sabemos o que é melhor pro outro. Às vezes, sem perguntar. Mas não, não sabemos o que é melhor para o outro. E tá tudo bem. Lidemos com essa frustração e com outras. Voltemos para as imposições. A impressão que dá, em tempos de pandemia, é que ditar o que o outro deve/pode fazer é como se estivéssemos ditando para nós mesmos: ‘faça yoga e esqueça o choro’, ‘faça cursos online e finja normalidade porque a realidade é cruel e dói’, ‘seja produtivo em tempo integral e não precisará se a ver com suas faltas e vazios’. Essa tal produtividade seria, então, um mecanismo de defesa para não se a ver com a realidade dada, ansiedade, frustração e tristeza que o momento sugere? A gente precisa ter cuidado ao negar a realidade, são riscos que a gente corre e ela pode voltar muito mais dura, potencializada, em forma de sintoma ou de posturas que nos destroem e, principalmente, destroem o outro. Podemos até sugerir como UMA das hipóteses que quem fura a quarentena pode estar tentando fugir da realidade dada. Tudo isto para fugir de sentir e vivenciar a dor advinda da frustração. Acontece que frustração também é vida. É motor. É engrenagem. Parafraseando uma de nossas psicanalistas preferidas, a Ana Suy: “saúde mental não é sobre não criar expectativas. É sobre poder se frustrar e encontrar modos de continuar - de novo e mais uma vez. É o que em psicanálise chamamos de castração, mas também podemos chamar de vida!” Está tudo bem não estar bem. Está tudo bem se sentir frustrado. Está tudo bem querer tirar um dia inteiro para chorar frente a pandemia e seus impasses. Permita-se não ter cabeça, estar confuso, não saber o que vai acontecer. É bem normal se sentir assim. Lembrando que raça e classe são determinantes importantes para a magnitude da frustração ou da síndrome de produtividade, mas falamos disso em outro momento. Inclusive, tá tudo bem também perceber que não está dando conta de ultrapassar este ou qualquer outro momento sozinho. Se achar viável, forme pares, amplie a rede de apoio, procure ajuda psicológica para falar sobre as frustrações que nos acomete e pensar novos caminhos, possibilidades, saídas, à partir de.