"Devo me libertar daquele que me sufoca, porque realmente não posso respirar”
Escrito por Psicóloga Maria Julia Viana da Silva CRP 06/159588
Publicado em 07 Apr, 2021
Estamos há mais de um ano vivendo os efeitos da pandemia, em todos os setores. Durante esse período começamos a nos relacionar de maneira diferente, com as pessoas, tempo, espaço e etc. Isolados, procuramos sempre pequenos alívios no entretenimento e foi assim que o Big Brother Brasil entrou na nossa casa. De outro jeito.
Ontem, durante o programa, João – um dos participantes do reality – relatou um episódio que aconteceu com ele poucos dias antes. Enquanto ajudava outro participante, Rodolffo, a colocar a roupa do monstro, escutou do sertanejo que o cabelo da fantasia – de personagem pré-histórico - era parecido com o dele. Na dinâmica, ao vivo, ao relatar o acontecido, o professor disse: “Lá dentro, no quarto, me calei, fiquei calado, mas você não sabe o quanto aquilo que você falou me machucou. Machucou muito. E não adianta você vir com o discurso que não teve a intenção porque eu tô cansado de ouvir isso, não é só aqui dentro. É lá fora também. Nunca ninguém tem a intenção de machucar. Nunca ninguém tem a intenção de fazer as coisas com a gente.”
O que João fez foi relatar algo vivenciado por ele e por todas as pessoas pretas, cotidianamente. O racismo, disfarçado de piadas, apelidos e brincadeiras, não deixa de ser violento – ou menos racismo. “Eu não tive a intenção”; “É só uma piada”; “Já falaram comigo e eu não fiquei com raiva”; “Eu tenho pai/amigo/irmão que também é preto”. Essas e outras formas de amenizar a violência são comuns após as práticas de racismo ser apontadas. Em seu livro “Racismo Recreativo”, Adilson Moreira diz “o humor racista é um tipo de discurso de ódio, é um tipo de mensagem que comunica desprezo, que comunica condescendência por minorias raciais”.
Por aqui, reforçamos que racismo é violência, da maneira que ele aparecer. Não é só sobre cabelo. Não é engraçado. Não é piada. Nunca será.
Toda solidariedade a João e a todas/todos pretas/pretos que sofrem no dia a dia os efeitos do racismo. Em tempos de pandemia, que a sobreviver virou luta diária, fazemos coro com Fanon e lutamos para libertação de tudo aquilo que nos sufoca, que nos violenta.
Imagem: @jeffcorsi